setembro 02, 2023

Nota de encerramento

Encerra-se aqui o Virtual Illusion que começou há 20 anos. Resolvi terminar este blog agora, por se relacionar com um ciclo académico que chegou ao fim. O Virtual Illusion foi criado quando iniciei a minha carreira académica e considero que cumpriu, excedeu, o seu propósito. É por isso tempo de refletir sobre o que foi feito, mas para isso preciso de o encerrar para poder distanciar-me e conseguir chegar a um olhar de fora.

THE END

O arquivo do Virtual Illusion permanecerá aqui enquanto a Google mantiver o hosting. Entretanto, iniciei uma nova etapa na plataforma Substack que intitulei de Experiências Narrativas, na qual vou continuar a publicar textos focados no domínico específico da minha investigação e ensino.


Atualização 25.11.2023

Acabei por ter de desistir do Substack, uma vez que a plataforma não permite a indexação dos textos pelo Google. Assim passei a publicar os resumos das narrativas que vou experienciando no Wordpress.

Atualização 25.12.2023

Acabei por ter desistir também do Wordpress, como expliquei num post no novo blog criado no Blogger, onde comecei a publicar os novos textos e intitulado Narrativa eXp.

agosto 31, 2023

A solidão do Ser

Em “Fora do Mundo”, o jornalista Michael Finkel conta a história de Chris Knight, o chamado eremita do Maine. Em 1986, com 20 anos, entrou no carro e conduziu pela floresta fora até ficar sem gasolina, abandonou o carro e as chaves, adentrou até encontrar um local suficientemente afastado da presença humana e estabeleceu-se, só voltaria a ser visto, e a falar com humanos, 27 anos depois, em 2013, quando foi preso por assaltar uma cozinha de uma área de piqueniques.


agosto 29, 2023

A escrita de Sara Mesa

Este ano voltei a ler Sara Mesa no verão, em espanhol em audiolivro, e gostei tanto que acabei lendo dois livros dela: "Cara de Pan" (2018) e "Cicatriz" (2015). Se gostaram de "Un amor" (2020), vão adorar, se não, é melhor passarem à frente. Sara Mesa (1976) criou um estilo próprio, construindo uma voz que nos serve como um olhar externo sobre as relações humanas, em particular a partir de jovens mulheres. Mesa não escreve para dar respostas, mas antes para se questionar, e é por isso que me atrai particularmente.

"Subitamente, Sós" de Isabelle Autissier

É uma pequena novela que tem algo muito bom para entregar, mas fá-lo de forma contida, nunca chegando a ser totalmente expresso, nem pelas palavras, nem pela forma da exposição. Estamos perante uma autora, Isabelle Autissier, que conhece de perto os sentires das personas criadas, não tivesse sido ela a primeira mulher a cumprir a volta ao mundo em veleiro a solo. O texto flui muitíssimo bem, ainda que se sinta que foi bastante editado para chegar a esta forma, o que acaba conferindo-lhe uma forma algo artificial, pouco orgânica. No entanto, começa-se a ler e não apetece parar, queremos, precisamos, de saber mais e mais. 


Mas o que realmente interessa é mesmo a capacidade de Autissier de expor passo a passo os níveis do isolamento humano, o avançar desse processo, o aprofundar dos seus efeitos, ainda que nunca se detenha para os enfatizar, fá-lo de forma natural, frontal e muito honesta. Não se procura aqui impressionar, mas apenas e só abrir espaço a um sentir humano pouco conhecido. 

agosto 27, 2023

Pessoa, o professor universitário

O heterónimo de Pessoa, Alexander Search, tinha um caderno de endereços assinado por si, datado de 1906 (Pessoa tinha 18 anos), em que a partir das correspondentes letras de busca, listou uma imensa bibliografia, cerca de meio milhar de livros, multilíngue — inglês, francês, espanhol e português — maioritariamente sobre filosofia, mas também psicologia, sociologia e religião, que pretendia ler nos tempos próximos. Pessoa leu muitos deles.


Como diz Richard Zenith, na biografia, se Pessoa em 1905 em Durban tivesse ido estudar, com uma bolsa, para Oxford em vez de voltar para Lisboa, é provável que o maior génio das letras portuguesas se tivesse perdido, mas em seu lugar teria dado "um professor universitário brilhante".
 

O caderno completo foi catalagado pela BNP como E3/144H, o PDF integral está acessível online.

"Sobrevivente do Gulag Chinês", por Gulbahar Haitiwaji

Em 2019 choquei de frente com imagens provenientes de Xinjiang que mostravam centenas de prisioneiros a serem encaminhados para comboios para seguirem para campos de concentração chineses que relembram as imagens reconstruídas pelo cinema do que se passou em Dachau, Treblinka e outros lugares. O livro "Sobrevivente do Gulag Chinês" foi publicado em França em 2021, e apresenta o primeiro testemunho de uma sobrevivente desses campos chineses, em pleno século XXI.

Os uigures vivem na região autónoma do Xinjiang, uma região enorme do noroeste da China, que além de funcionar como corredor central da antiga "Rota da Seda" e da atual "Belt and Road Initiative" (que procura impor a agenda chinesa no mundo), é ainda uma região rica em petróleo.

Li o livro na versão audiolivro (Scribd)

Europa: Digital Services Act (DSA)

O Digital Services Act (DSA) da UE entrou em vigor, esta sexta-feira, 25 agosto 2023, e representa um enorme avanço na proteção dos utilizadores das redes sociais e serviços digitais, que ao longo das últimas décadas têm sido usados como cobaias e carne para canhão pelas grandes empresas que se têm servido do melhor do design e tecnologia para proveito próprio, sem ter de obedecer a quaisquer leis.

Imagem: 2022 Cristian Storto/Shutterstock

. As plataformas digitais, com mais de 45 milhões de utilizadores, passam a ser responsabilizadas legalmente pelos conteúdos que são publicados nelas: "o que é ilegal offline, deve ser ilegal online."
. As plataformas deixam de poder apresentar anúncios com base em dados sensíveis do utilizador (ex. origem étnica, opiniões políticas, religião ou orientação sexual);

. As plataformas têm de rotular todos os anúncios e informar os utilizadores sobre quem os está a promover;

. As plataformas são obrigadas a dar aos utilizadores o direito de optarem por não utilizarem sistemas de recomendação (For You vs. Following) 

. As plataformas são obrigadas a dar aos utilizadores o direito de optarem por não serem alvos de publicidade personalizada (ad targeting);

. As plataformas deixam de poder classificar os seus próprios serviços ou produtos de forma mais favorável (auto-preferência) do que outros terceiros nas suas plataformas. (Ex. os posts com links ou os vídeos do YouTube, não podem ser despromovidos por apontarem para fora das plataformas);

. Por outro lado, ficam obrigadas a partilhar dados essenciais com investigadores e autoridades, a cooperarem com os requisitos de resposta a crises e a realizarem auditorias externas e independentes.
Mas tudo isto acontecerá apenas dentro das fronteiras da UE, pelo menos até que esta abordagem se comece a universalizar.


+informação

agosto 25, 2023

"Filho Nativo" (1940) de Richard Wright

"Filho Nativo" (1940) é um clássico da literatura americana, um dos primeiros livros a colocar o dedo na ferida do racismo nos EUA. À altura, Richard Wright vivia sob a sedução do marxismo, que lhe serviria aqui para colocar em evidência a opressão dos valores identitários. Pouco depois haveria de abandonar a militância do comunismo por esta se recusar a sair da redoma restrita da luta de classes. Tudo isto é trabalhado segundo uma estética noir que não se coíbe de usar imagens de grande violência, a roçar o verdadeiro horror, trabalhada por uma trama repleta de surpresa capaz de envolver os mais diversos públicos. A mais recente adaptação ao cinema de 2019, por Rashid Johnson para a HBO, procura atualizar alguns dos tópicos em face da evolução da sociedade americana, mas sendo interessante diria que é menos conseguida, particularmente porque Wright impregna toda a sua escrita de uma raiva fervilhante que o filme é incapaz de atingir.

agosto 24, 2023

“Los Vencejos” de Fernando Aramburu

“Los Vencejos” (2021) é o sucessor de “Patria” (2016), o livro que trouxe reconhecimento internacional, incluindo direito a série HBO, a Fernando Aramburu. Se o estilo, de contador de histórias, permanece inalterado, o tema distancia-se, tal como a abordagem. Deixa-se para trás o terrorismo vasco e adentra-se agora os efeitos sociais do pós-patriarcado na figura masculina. Mantém-se a visão acutilante, mas em vez de sustentada pela tragédia, esta é agora baseada na sátira e humor negro que se tornam centrais no suportar de toda a vil misantropia ao longo de 700 páginas.

Imagem da web, lido na versão audiolivro com narração de Germán Gijón (Scribd).