maio 16, 2012

só, com a vergonha

Steve McQueen escreveu e realizou apenas dois filmes, mas conseguiu desde já dar vida ao nome que carrega. Hunger de 2008 e agora Shame (2011) são duas obras singulares, e verdadeiramente coerentes esteticamente. Por mais que me afaste da temática presente no filme, e por mais que sinta vontade de escapar dali, a mestria cinematográfica ao serviço da narrativa é de tal ordem poderosa que isso se torna impossível.


Shame é como um banho de cinema, em que um autor usa e abusa da linguagem à sua disposição para se expressar, para comunicar, para falar conosco. O ritmo, os enquadramentos, o som atmosférico, a música (a excelência de Glen Gould), a fotografia, a cor e a luz, os cortes e recortes no tempo, tudo mas mesmo tudo, está correcto. Correcto não por ser tecnicamente perfeito, mas por ser esteticamente coerente.


E como se não bastasse, McQueen serve-se uma vez mais de Fassbender, que aqui claramente se excede, e faz provavelmente a interpretação da sua vida. Ebert fala na sua crítica, numa imagem que também me ficou na cabeça, um momento no qual Fassbender consegue expressar simultaneamente dor, tristeza e raiva. A cena está repleta de luz, com uma temperatura bastante quente, em câmara lenta, a música angelical, e o orgasmo quase ali. É um momento de cinema inesquecível, um momento no qual um simples artefacto, feito de dramatização plasmada em imagens e sons nos "toca", mexe conosco. Sentimos por momentos uma ligação forte com o personagem, com o actor, o filme transpôe aqui a barreira do ecrã, e somos apenas nós, e as emoções ali representadas.

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