maio 09, 2009

i para o seu público

Comprei o primeiro e segundo números do jornal i e posso dizer que fiquei bastante satisfeito, por variadas razões.

1 - A leveza do espectro informativo que em minha opinião se deve há ausência das famigeradas categorias já tão tipificadas pelos jornais comuns.

2 - A componente gráfica que lhe confere uma identidade própria. Baseada em formatos de revistas ou outros, o que é irrelevante, até porque original original só Adão e Eva.

3 - O editorial é honesto e fala com o "seu" público à semelhança dos spots que vão passando no rádio.

4 - Nota-se uma clara aposta no modelo opinativo que não é camuflado por entre as notícias mas assume o primeiro plano conferindo ao jornal um modelo menos hermético, menos veiculado pelo fluxo jornalístico e mais pela opinião da enorme quantidade e acima de tudo diversidade de pessoas da sociedade que ali imprimem a sua visão.

5 - O excelente spot rádio diz muito sobre o jornal. Sinto uma identificação completa com o factor de estar saturado de tanta informação, que na maior parte das vezes pouco ou nada diz e que se acotovela para nos entrar pelos sentidos adentro. Tenho em muitos momentos, que cada vez se vão prolongando mais no tempo, deixado deliberadamente de comprar jornais e ver telejornais, por pura saturação. A quantidade, a agressividade e a homogeneidade de conteúdo e forma deixam-nos cada vez mais imunes ao apelo dos arautos da informação.

Quanto ao que menos gostei. Essencialmente não gostei, ou melhor, fez disparar um alerta dentro de mim, sobre um facto que se adensa cada vez mais na sociedade portuguesa. A subserviência à cultura americana. Respira-se demasiado EUA no jornal, como vai acontecendo um pouco por todo o lado em Portugal. Isto é representativo da mudança da bússola cultural nacional que mudou nos últimos 10, 15 anos a agulha da França para os EUA. Gostaria de ler trabalhos sociológicos sobre este facto, o que está por detrás do mesmo, porquê tanto seguidismo dos padrões americanos. Agora que pertencemos a uma identidade cada vez mais realizada do cidadão Europeu estranho que o nosso quotidiano se permita ser trucidado desta forma agressiva.

Ao contrário de outros colegas, não gostei particularmente do sítio, fica muito aquém do jornal. Mas não me choca, o facto de existir desde o primeiro número é muito bom e terá a seu tempo capacidade para se ir autonomizando e ganhando vida própria. Não esqueçamos que são dois projectos o jornal papel, e o jornal digital. Uma boa parte da imprensa aposta de forma superficial na rede, e os que o fazem com qualidade levaram anos a consegui-lo. São muitas as revistas que saem para o mercado sem sítio no primeiro mês e até muitos meses depois. É um investimento paralelo que claramente deve ser racionalizado em tempo de contenção em função do sucesso que o jornal papel possa atingir. Mas pelo menos sabemos que existe um interesse claro em seguir por aí.

Quanto aos críticas dos meus colegas jornalistas e académicos do jornalismo (1, 2, 3) tenho apenas a dizer que claramente este não é um jornal para vós. Deixem-nos desfrutar de algo que se apresenta com uma nova visão e ideia da realidade.

2 comentários:

  1. Nelson,

    Umas notas (com muita tristeza, acredita):

    Três ou quatro dias depois do primeiro número continua a achar - como tu - que se trata de uma coisa criada para o eixo Lisboa/NY, a meio caminho entre a revista de moda e um jornal, a meio caminho entre a promessa de dar informação sólida, original e consistente e o apelo desmesurado ao acessório, a meio caminho...tudo a meio caminho.
    E, não sendo para nós (aceito), será para quem? Não é, por certo, para quem quer estar bem informado. Não é, por certo, para quem quer boa informação complementar sobre os assuntos do dia. Não é de certeza, para quem quer ter reflexões de alta qualidade sobre o tempo que vivemos. Isso, não é. Então é para quem? Vende o quê?
    A opção estratégica para a revista de sábado é talvez o exemplo supremo do triunfo do vazio, claramente próxima daqueles suplementos temáticos de uma daquelas revistas que se folheiam em 3 minutos num consultório médico.
    É um ideia que foi vendida ao Expresso e que foi agora - pela mesma empresa - vendida também ao i; a de que deve apostar-se em números monotemáticos, preferencialmente em torno de palavras/conceito. Please, GaFB...como diriam os senhores do NYTimes!

    Isto é grave não apenas pelo que nos diz sobre o i mas, sobretudo, pela imagem que dá do que é necessário fazer para reaproximar o jornalismo das pessoas.
    Num tempo em que - como dizes - vivemos inundados de ruído, seria necessária uma voz de confiança, sólida, perspicaz. O i aposta em tudo menos nisso.
    O i faz, num projecto novo, algo que projectos velhos fizeram, sem sucesso, nos Estados Unidos para fugir ás quebras de receitas - aposta em menos conteúdos, num pacote mais bem desenhado. Alguns deles já fecharam e outros estão a caminho.
    É mesmo difícil enganar muita gente durante muito tempo - o gordinho do charuto tinha razão!
    Um abraço,

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  2. Luís
    Aceito grande parte do que aqui referes, e por isso referi a leveza do tratamento, mas por vezes também não queremos tanta profundidade.

    Contudo percebo a dimensão do que referes e tenho pena de não ter comprado no sábado para averiguar o que dizes, mas sinto que isso é muito provável. Claro que acabamos por ficar com a ideia de que falta alguma solidez e acima de tudo que nos transmita a "confiança" coisa que é cada vez mais difícil nos tempos de total ausência da mesma até pela raiz da crise actual.

    Do meu lado vou dar o benefício da dúvida mais algum tempo e depois formarei uma opinião mais final. E obrigado pelos teus comentários que claramente lançam luz sobre muito do que fica escondido nos bastidores do jornalismo.

    abraço

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