abril 01, 2010

Cinema Português em 2010

Texto despoletado pelo programa Radar de Negócios de 2010.03.21, referenciado no CG Luso, a respeito da "Indústria de Cinema Portuguesa". O programa pode ser visto na integra aqui.

Sempre defendi o Cinema Português, por essa razão fui um dos responsáveis pela reactivação do festival Caminhos do Cinema Português em Coimbra em 1997, que estava parado há mais de 10 anos. O único festival inteiramente dedicado ao cinema português e que vai agora para a sua XVII edição, um festival que vai ganhando o seu espaço e criando espaço para o nosso cinema.

Um dos maiores problemas do cinema português tem sido desde sempre a falta de capacidade técnica, havendo claramente excepções em todo a história do nosso cinema. Mas durante anos tivemos incapacidade de desenvolver som directo de qualidade, e por isso este era depois ultrapassado com dobragens de som de qualidade muito medíocre. Depois as performances dos actores que se mantiveram até aos anos 90 coladas a lógicas de trabalho teatral, tão distantes da actividade de performance em cinema. A cinematografia foi outro calcanhar, raramente se viu filme nacional em que houvesse uma real preocupação com a técnica fotográfica. Para não falar de guionismo, ou tratamento visual dado aos textos, tão pobre de tão dependente do diálogo. Mas muito disto começou a mudar nos finais dos anos 90 com o aparecimento da televisão privada e de forma mais clara ainda com o aparecimento da indústria audiovisual publicitária nacional.

Quanto a ter cinema português no circuito internacional, é preciso primeiro entender a distribuição internacional, não apenas economicista mas também cultural. Do lado económico é impossível combater pesos pesados de Hollywood quando 1/3 da sua fatia vai para comercialização e distribuição, falamos de várias vezes o valor que custa toda a produção de um filme em Portugal. Depois a questão cultural, o cinema americano não é visto em todo o mundo apenas por razões comerciais, mas é-o pelo seu apelo cultural, os temas que trata e a forma como os trata ou seja, os temas são universais e estes são sempre tratados recorrendo a uma palete de emoções a estimular no espectador o mais universais (ou básicas) possíveis. A exemplo disso repare-se em Avatar (2009) e veja-se onde está o apelo do filme ao nível narrativo, na relação amorosa entre dois seres diferentes, a componente ecológica surge como adorno no momento actual da preocupação com o planeta. O mesmo tinha sido feito com The Day After Tomorrow (2004) em que o essencial rodava à volta de um pai em busca do filho e não das condições climatéricas.

Quanto à dimensão, tem muito que se lhe diga, a verdade está aí à nossa frente, os filmes do António Pedro Vasconcelos começam a pagar-se a si próprios (não sei se é contabilizado o financiamento do estado nesta equação). Já agora não fica muito bem ao António Pedro Vasconcelos dizer não existem filmes Portugueses citados em listas de 1000 ou 5000 filmes a ver, isso não é verdade de todo. Basta olhar para as listagens dos melhores filmes da década 2000-2009 em várias das revistas mais importantes de cinema dos EUA e Europa para ver como não o é.

Sobre tudo isto Orson Welles disse,
Fazer cinema é 98% do tempo à procura de financiamento e 2% do tempo a fazer filmes.
O cinema é uma arte demasiadamente cara para poder estar ao serviço de determinados caprichos pessoais, é antes de tudo o mais uma arte colectiva. E não esqueçamos que a arte foi e é antes de mais fruto de quem Encomenda, não de quem a Faz. A ideia de que o autor é o visionário e pode fazer tudo o que quer é um romantismo com pouco mais de 200 anos só aplicável à literatura e à pintura em pequena escala. Miguel Ângelo não fez o que quis na Capela Sistina, Leonardo DaVinci respondia perante os seus mecenas, etc., etc.

Contudo as revoluções tecnológicas trouxeram o cinema para novos patamares de possibilidades. Vejam-se casos como 405, World Builder, ou Ataque de Panico!. E já agora porque não pesquisar no YouTube os milhares de trabalhos que vão sendo feitos por esse mundo fora, com 1, 2 ou 3 pessoas. Tudo depende de cada um de nós, da nossa criatividade, que depende do nosso investimento, que depende do nosso entusiasmo, que depende da nossa motivação...

2 comentários:

  1. Olá, bom dia,

    Só um comentário sobre a economia do cinema português: não sei quais são os seus dados, mas acho muito difícil o António Pedro Vasconcelos ter os seus filmes pagos pela receita de bilheteira.

    Segundo contas de um produtor (Pedro Borges, da Midas), o "Bela e o Paparazzo" teve "uma receita de 360 mil euros de bilheteira. Mas isso dá pouco mais de 100 mil para o produtor e o realizador." (no artigo publicado no Ipsilon). Claro que o filme teve subsídio do estado (a fundo perdido), mas isso não deve contar para a economia de uma "indústria". Afinal, todas as longas-metragens feitas em Portugal (ou quase todas) só são feitas porque há subsídios do estado. É incontornável.

    Sobre a internacionalização há muito a dizer, mas fico com um dado curioso: o filme "Aquele Querido Mês de Agosto" já estreou em vários países com um sucesso à sua escala.

    (Mas faltam dados, claro. O grande problema é que faltam sempre dados credíveis. Até na montagem financeira dos filmes).

    um abraço,
    Daniel Ribas

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  2. Olá Daniel
    Obrigado pelo comentário.

    Sobre os dados, eles são referidos pelo próprio APV em entrevista ao Radar de Negócios, veja o programa no link.
    Mais dados não tenho e a julgar pelos que nos trás aqui, fico com a suspeita que tinha, confirmada, ele não está a contabilizar o financiamento estatal, assumindo-o como fundo perdido, e está mal.

    De qualquer modo existe uma evolução, em termos económicos obviamente. Aliás parece ter sido divulgada uma lista dos "15 filmes portugueses mais rentáveis" mas ainda não encontrei registos oficiais, se souberem de algo avisem.

    um abraço

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