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junho 14, 2015

A vontade de ser (e recriar o) humano

Ex Machina é a nova jóia da coroa da ficção científica cinematográfica, apesar de trabalhar um tema — a Inteligência Artificial — já tão intensamente discutido e aprofundado sob os mais diversos ângulos: a consciência ("2001: A Space Odyssey” (1968); “Blade Runner” (1982)); as emoções ("A.I. Artificial Intelligence" (2001); "I, Robot" (2004)); a igualdade ("Metropolis" (1927); "Bicentennial Man" (1999)); o controlo ("The Matrix" (1999); "The Terminator" (1984)); a companhia ("Her" (2013); "Wall-E" (2008)); a inteligência (“Colossus: The Forbin Project” (1970); “Star Trek: Generations” (1999), etc.. Assim, apesar de não parecer, “Ex Machina” traz algo bastante novo, apresenta uma proposta para definir o momento em que a máquina se torna verdadeiramente humana (a singularidade), por um meio que vai muito para além do “Teste de Turing”, ou seja, em que esta se torna capaz de dar resposta aos três fundamentos base da vontade humana: autonomia, competência e conectividade.



Não posso entrar no detalhe da explicação das três variáveis sem desvendar o enredo, e por isso mesmo não o farei aqui, direi apenas que este método se poderia designar por “Labirinto da Vida”. Julgo que é um filme obrigatório ver, porque é um filme que não se cola ao deslumbramento tecnológico, concentrando-se antes na essência daquilo que nos torna humanos. Aliás, somos confrontados com um ser (Ava), servido de qualidades da fisionomia homínidea, mas incompleto à superfície, demonstrando a sua natureza maquínica, com o objectivo claro de nos obrigar a ver, e a sentir, além da tecnologia. Claro que esta incompletude na forma é cirurgicamente desenhada, com a cara, centro nevrálgico da comunicação humana, a permanecer intacta.

Diga-se que o trabalho preconizado por Alicia Vikander é grandemente responsável pela eficácia do filme. Vikander consegue desenvolver toda uma linguagem corporal e facial, que se encaixa claramente entre o Uncanny Valley e o Humano. Claro que ajuda o facto de ela não se apresentar vestida como nós, mas o modo pausado e rítmico como ela se move e interage é tão específico, longe do comum robô, mas também diferente do comum humano. Ao longo do filme, podemos nem ter consciência do facto, mas sentimos ali algo distinto. Não tinha conseguido perceber como tinham conseguido esta nuance, até que numa entrevista Alex Garland explica que Vikander tinha estudado Ballet enquanto jovem, conseguindo assim exercer um controlo perfeccionista dos movimentos do corpo, que ela acabaria por usar aqui para estabelecer a linguagem corporal de Ava.

Teaser de “Ex Machina” (2015)

Como um todo, temos uma obra imensamente coesa no modo como vai gerindo a informação, acompanhada por uma estética profundamente racionalizada, tudo coordenado por Alex Garland, que é  autor da ideia, do guião e da realização. De alguma forma acredito que é diferente quando um realizador parte para filmar uma ideia que é sua, desde que tenha competências para a levar a bom termo. Garland tinha visto várias das suas ideias chegarem ao cinema com “The Beach” (2000), “28 Days Later…” (2002) e “Sunshine” (2007) sempre pelas mão de Danny Boyle. Depois dedicou vários anos a adaptar ideias de terceiros, “Never Let Me Go” (2010) e “Dredd” (2012) para o cinema, e o videojogo “Enslaved: Odyssey to the West” (2010). “Ex Machina” surge assim como uma espécie de súmula de todo este trabalho, da escrita original à visualização de ideias, emergindo um projecto profundamente autoral pela clara vontade de expressar uma visão.

abril 06, 2014

Expressão facial sem sentimento de estranheza

A animação facial tem sido um dos maiores problemas do realismo 3d, desde "Final Fantasy: The Spirits Within" (2001) a "Avatar" (2009), passando por "Polar Express" (2004) ou "Beowulf" (2007), já muito foi feito para conseguir ultrapassar a estranheza que resulta da animação de personagens demasiado realistas. Neste sentido a Cubic Motion juntou-se à 3dLateral para produzir uma técnica capaz de ultrapassar esses problemas. Esta técnica funciona essencialmente ao nível do software, exigindo apenas uma simples câmara e alguns marcadores para funcionar, em contra-corrente com aquilo que tem sido prática até aqui em termos de técnicas de digitalização, que têm procurado capturar mais e mais informação.




Na demo "Lydia" (ver vídeo abaixo) a captura da performance de Lydia Leonard foi realizada com uma câmara apenas, pela Infinite Realities, o rig do personagem 3d (esqueleto, ou conjunto de pontos internos para animação) foi desenhado pela 3dLateral, e a ligação entre os dados capturados pela câmara e o rig foi feita pela Cubic Motion. A Cubic diz que no processo de captura facial não podemos utilizar os mesmos métodos de captura que temos vindo a utilizar com a captura de movimentos de corpo, porque as relações de posição não funcionam da mesma forma. O uso dos métodos tradicionais de "pose-based retargeting" baseiam a animação em complexos processos de "aprendizagem" e "previsão" a partir das poses capturadas, e isso tem tendência para acentuar problemas, uma vez que requer poses sempre muito aproximadas.

imagem retirada do Making of Synchronicity (2013) 

Nesse sentido a Cubic desenvolveu uma nova abordagem matemática de resolução da malha capturada a partir dos algoritmos de visão por computador, que desenha todo um sistema capaz de operar as variações de animação, sem necessidade de recriar as poses, ou seja necessidade de recorrer a algoritmos de aprendizagem (neural-networks, etc). A ideia é que todo o processo de tradução dos pontos da captura para o rig seja realizado segundo definições humanas do movimento, e não em função de cálculos matemáticos arbitrariamente definidos pelos sistemas, e seja depois concentrada num algoritmo de resolução das necessidades do movimento. No caso da Lydia a 3dLateral modelou a cabeça, texturizou e desenhou o rig ao qual depois associou o algoritmo criado pela Cubic, para "dar vida" ao modelo.


 Demo "Lydia" (2013)

Posso dizer que daquilo que nos é dado a ver neste curto segmento de menos de 30s, o problema do "uncanny valley" (Zagalo, 2009:69) foi completamente ultrapassado, no que toca a expressão facial. Ainda não se pode dizer o mesmo da animação da cabeça, problema que se identifica ainda melhor na curta, "Synchronicity" (2013) (ver aqui abaixo), realizada pela 3dLateral para exemplificar o alcance desta técnica. Mas se se fixarem apenas na expressão facial, não falta lá nada, o realismo é completo, nada de uncanny surge ali.


"Synchronicity" (2013) de Mark Healy

Este sistema não é algo ainda no domínio da investigação apenas, a 3dLateral começou já a utilizar estas técnicas na produção de expressões para os personagens de "Ryse: Son of Rome" (2013) e parece que vários jogos que estão agora a sair já incorporam estas técnica. A realidade é que com a necessidade de cada vez maior realismo 3d a ser exigido pelas consolas de videojogos, é necessário encontrar processos que agilizem a produção e melhorem o que já temos, apesar do caminho já percorrido não deixar de ser impressionante.

março 10, 2012

por detrás de Kara

Tenho visto falar-se muito da narrativa por detrás de Kara, a Wired fala da influência do livro The Singularity is Near (2005) de Ray Kurzweil, e na entrevista realizada, David Cage refere "que virá o dia em que a inteligência artificial será mais esperta que nós, e isso é inevitável, este clip é sobre esse momento". Mas na verdade em várias formas de inteligência as máquinas já são superiores a nós, nomeadamente no processamento de cálculo e na memorização de dados (Deep Blue já tem 15 anos). O que ainda nos separa é algo menos matemático, menos linear, digamos mais humano.


As maiores influências deste clip, estão há muito no cinema, começando bem cedo com Metropolis de Fritz Lang em 1927. Já o momento da "desassemblagem" em termos de guião é totalmente decalcado de 2001: A Space Odyssey (1968) de Stanley Kubrick. É impossível não relembrar uma das melhores cenas do cinema de sempre, com Hal 9000 murmurando,
I'm afraid. I'm afraid, Dave. Dave, my mind is going. I can feel it. I can feel it. My mind is going.
2001: A Space Odyssey (1968) de Stanley Kubrick [Ver a cena completa]

E depois não podemos deixar de relembrar o maior clássico de sempre sobre o assunto Blade Runner (1982) de Ridley Scott, baseado no fabuloso Do Androids Dream of Electric Sheep? (1968) de Philip K. Dick, que utilizava o Teste de Turing para separar o humano da máquina. Quando David Cage diz que "Para mim eu penso que vai acontecer como um erro numa fábrica, e é algo que nunca deveria acontecer - mas aconteceu". Está apenas a dizer aquilo que já viu representado em The Terminator (1984) ou em Matrix (1999) dos irmãos Wachowski. Mas mais do que estes, o tema foi brilhantemente explorado por Spielberg e Kubrick em A.I. Artificial Intelligence (2001) que nos trouxeram aquele que eu considero ser o melhor filme sobre o assunto, porque discute o que está verdadeiramente em questão aqui, a emoção.

A.I. Artificial Intelligence (2001) de Steven Spielberg

No campo estético este clip da Quantic Dreams é por seu lado totalmente decalcado de I, Robot (2004) do Alex Proyas e de All is Full of Love (1999) de Cunningham. A diferença em Kara é que assistimos à sua transformação em humano visualmente. Mas neste clip podemos ver como Sonny expressa as suas emoções de modo brilhante.

I, Robot (2004) de Alex Proyas

Tudo isto não devia tirar valor ao filme da Quantic Dreams, porque este está a correr em tempo real na PS3. Mas na verdade, tira, porque apesar de estar a correr em tempo real, a linguagem é toda cinematográfica. Nada ali é interactivo, como tal estão a ser utilizados todos os truques da ilusão cinematográfica para nos levar a acreditar em algo que é muito diferente daquilo que nos é mostrado. Falo essencialmente do processo de montagem.


Quando Robinson da Eurogamer menospreza o trabalho em L.A. Noire (2011) da Team Boundi dizendo que está cheio de performances fracas, ou que Uncharted (2011) da Naughty Dog, estava mais preocupado com o entusiasmo cinematográfico do que o puro drama adulto, esquece que ali temos interatividade, aqui não, e isso faz toda a diferença. Concordo no entanto, que ambos esses projectos estão longe da qualidade dramática explorada em Heavy Rain (2010), mas isso vai muito para além da expressão facial, estamos a falar de toda uma diferente abordagem à arte interactiva. Algo que David Cage explica muito bem quando diz,
"Estou interessado em explorar tudo que seja humano, seja no passado, presente ou futuro, não importa. É tudo sobre seres humanos e as emoções e as suas relações, como sentimos, como amamos e como odiamos. É o que quero explorar - tudo o resto é fundo."
Ainda assim o filme surpreende claramente pela qualidade do motion capture, pela qualidade técnica da iluminação, o brilho lacrimoso dos olhos é estonteante, e pelo nível de detalhe nos movimentos dos músculos da face. Mas não, não estamos mais próximos de ultrapassar o Uncanny Valley como diz o Cage, este curto clip ainda o deve muito à qualidade da montagem cinematográfica. E sim acredito que o trabalho com Kara tenha sido feito há um ano, mas a montagem e pós-produção, que foi agora libertada, não, e é ela que garante muita da ilusão nos sentimentos que sentimos. Ficamos a aguardar o jogo, entretanto revejam o filme.

Kara Project (2012) da Quantic Dream



UPDATE 21 Março 2012: 
Agradeço ao Manuel Correia pelo envio do making of.

Making of Kara Project (2012)

fevereiro 02, 2010

Avatar, um mundo de influências

Avatar é um filme que em termos de preferências jogará nos extremos para os menos ciosos da arte cinematográfica. Pelo meu lado limito-me a apreciar mais um artefacto fílmico e a deixar-me levar pela experiência. Claramente que gostei de muitas coisas assim como gostei menos de outras. O que mais gostei foi evidentemente do brilhantismo tecnológico, é um dos objectos mais perfeitos nesse campo. Do que menos gostei, do storytelling, da incapacidade de Cameron em nos entregar uma história criativa, ou pelo menos com uma progressão e um ritmo acertado. Assim dito até parece que me ficaria pelos 50%, mas não, na verdade não podemos condenar um filme porque falha num item (que é dos mais importantes sem dúvida), tendo em conta que actua em níveis de excelência em áreas formais como os efeitos visuais, os cenários, a atmosfera, os personagens. Nesse sentido sinto-me encalhado a meio dos restantes 50%.


Roger Ebert
refere "I've complained that many recent films abandon story telling in their third acts and go for wall-to-wall action. Cameron essentially does that here, but has invested well in establishing his characters so that it matters what they do in battle and how they do it. There are issues at stake greater than simply which side wins."

O que Ebert aqui refere na primeira parte desta afirmação é o mesmo que já referi em relação ao videojogo Uncharted 2 (2009). Mas discordo por completo com ele na segunda parte desta citação, assim como Zacharek (2009). Fico a pensar porquê 160 minutos, qual a razão. Para que seja considerado um épico?! É no terceiro acto que o filme se espalha por completo. Ao contrário de Titanic aqui sabemos que os nossos heróis não morrerão, e é por isso mesmo que Cameron mata um importante personagem perto do final, para ainda assim tentar criar a dúvida e a incerteza no espectador sobre o futuro do herói. “Se aquele pode morrer, então o herói também pode”. Mas desde o momento em que se inicia a ligação entre o herói e aquele povo que sabemos que só um final pode existir. E isso demonstra a total inabilidade de Cameron para lidar com o balanceamento narrativo necessário a uma produção desta magnitude. Aliado a esta fraqueza aparece em jeito compensatório e climático, a seguir toda uma estrutura típica da narrativa de horror, o retorno do vilão quase imortal, uma e outra vez, procurando despoletar no espectador sensações, e receios por algo que sabemos não poder existir.


Vejamos a história. Todo o aspecto de guerrilha em busca do mineral é ridículo porque de tal forma exacerbado acaba por contaminar todo o aspecto espiritual do povo indígena. E contamina porque esta é a velha história do cowboy e do índio, do colonizador e colonizado, do agressor e da vítima. Ou seja, elementos tão básicos e tão vulgares que se não forem tratados de modo minimamente interessante ou subtil acabam por corroer tudo à sua volta. Por outro lado esse lado espiritual soa todo muito rebuscado e pouco interessante porque mais uma vez se mostra demais, se fala demais, se explica demais. Algo de tão mágico e divino deveria ser menos acessível. Um utilizador, Kyle M, no Metacritic refere mesmo “the entire story was a ripoff of other movies, the characters were all stereotypes.”. E tem razão ao dizer isto, em Avatar passamos grande parte do tempo a realizar comparações com outros filmes – Star Wars (1977), The Neverending Story (1984), The Emerald Forest (1985), Aliens (1986), Willow (1988), Dances With Wolves (1990), Stargate (1994), Final Fantasy: The Spirits Within (2001), Apocalypto (2006), District 9 (2009). Num outro artigo Christopher Campbell afirma “James Cameron’s Avatar is supposed to be like nothing we’ve ever seen before. So why does it look so familiar?” A resposta é muito simples, porque um filme tão caro como este teria de agradar a Gregos e Troianos. Porque para isso acontecer a única forma era transformar o produto em algo o mais fácil possível de assimilar, o mais fácil de compreender e logo familiar assim como o mais emocionante ainda que do ponto de vista das emoções simples – medo, raiva, tristeza e alegria.


Neste sentido da familiaridade mas em relação ao que fez melhor e no campo dos efeitos visuais Avatar partilha imenso com Star Wars a começar pela criação de todo um universo novo alternativo, uma sociedade externa à humana com todos as suas peculiaridades de forma e habitat. Ao mesmo tempo várias coisas os separam a começar pelas criaturas e as suas formas mais familiares: panteras, rinocerontes, dinosauros voadores. Isto permite-nos aproximar mais daquela realidade. Em Star Wars as formas são tão estranhas que nos deixam pouco há vontade e nos obrigam a uma descolagem maior.


Tecnicamente as qualidades de Avatar estão na captura de performance, no qual claramente investiram muita pesquisa e desenvolvimento de soluções para criar o que podemos agora ver. Estes impactos percebem-se melhor quando vemos os making of, e vemos a tecnologia envolvida e mais do que isso vemos o efeito da captura directamente sobre o desenho 3d. Contudo e apesar do brilhantismo das técnicas, e superioridade face a muito do que se tem feito, não são elas as responsáveis por eliminar o efeito uncanny valley, é antes um conjunto de dois vectores: iluminação e cartoon. Ou seja é a superioridade da iluminação verdadeiramente fotorealista que cai sobre os personagens e lhes confere um acetinado realista ao mesmo tempo que as suas feições são meramente hominídeas. Se compararmos Sigourney Weaver em Avatar e Angelina Jolie em Beowulf (2007) conseguimos de imediato ver o efeito de uncanny a acontecer com Angelina mas o mesmo não se sucede com Sigourney aqui. Mas se olharmos novamente para "Sigourney Avatar" veremos que esta é uma Sigourney com formas exageradas (olhos e orelhas aumentadas, pele de cor diferente) tal como o aquilo que fazemos com um cartoon. E por isso funciona tão bem. Aliás não podemos deixar de referenciar todo o trabalho feito por Andy Serkis com Gollum, e no quão credível Andy Serkys tornou esse personagem 3d.


Para além da captura de performance temos todo este universo criado em CGI, "Of the 162 minutes of film, 117 minutes equaling 1,832 shots was created by Weta's angels, over 2,000 if you count the omits." (CGSociety). Com uma selva construida de modo generativo ou procedural, ou seja em que as árvores embebidas em código crescem e se multiplicam de forma "natural" sem a ajuda de qualquer modelador humano. Um universo que inicialmente deveria ter sido criado em tons de azul à semelhança das criaturas mas acabou por ficar verde. Motivo da alteração: "demasiado azul". Em minha opinião mais uma vez por questões de familiaridade. Um universo de plantas azuis seria algo surreal e distante para nós, por outro lado um universo verde é do mais exótico e ecológico que se possa imaginar.


Quanto ao 3-D fiquei convencido da sua possibilidade, não da sua necessidade. Ou seja por nenhum momento me senti perturbado pelo mesmo, nem pelos óculos. Mas também não senti nunca que a minha experiência tivesse sido enriquecida face a um visionamento normal 2d. Aliás senti em certas alturas um efeito de túnel, no qual se perdia o poderoso efeito do wide scope tão característico do 2:35. A experiência de paisagem em toda a dimensão do olhar porque tudo se concentra no centro e em profundidade. Quando tomamos atenção ao detalhe perdemo-nos por vezes a ver a beleza do recorte dos personagens sobre o fundo, mas isto parece surgir como layers (camadas) de elementos independentes no filme. Julgo mesmo que este modo acaba por elevar mais barreiras de artificialidade do que aquelas que retira. Sentimo-nos a olhar para dentro de um mundo “plástico”. Apesar de feito com um nível de excelência muito grande, apesar de eu não ter sentido absolutamente qualquer desconforto, sou muito sincero, não sinto que tenhamos ganho algo com esta tecnologia. Por outro lado acredito que se esta tecnologia for antes pensada para preencher todo o muro frontal mais uns 50% das paredes laterais de uma sala de cinema, aí julgo que poderemos ganhar algo.


Finalmente e sobre o conceito de Avatar em si, julgo que vem levantar questões bem diferentes das levantadas por Matrix e a sua realidade substituída, aliás as mesmas questões recentemente levantadas em Surrogates (2009). Aqui já não temos as questões cartesianas da mente desligada de um corpo refutadas por Damásio. Ou das realidades injectadas (ex. Matrix, 1999), caso do cérebro numa tina, dependente de informação que lhe chega por via de eléctrodos. Temos antes uma pessoa completa, mente e corpo, que por sua vez controlam um outro corpo em pleno estado acordado. Aliás o filme exemplifica este modo constantemente através dos robôs grandes que são controlados por militares no seu interior.


Posto tudo isto Avatar é uma aventura através da imaginação de um criador, é mais um mundo-história do tipo dos criados na arte dos videojogos do que propriamente a narrativa finita de um filme. É um mundo-história atractivo e cativante, um escape do nosso mundo. Avatar não nos deixa indiferentes, ficamos colados naquele universo durante muitas horas após o seu visionamento...

março 17, 2009

robôs mais humanos


Ao nivel da robótica, parece que o Uncanny Valley de Mori se começa a esbater. Repare-se na perfeição da empatia gerada pela cara do robot HRP-4C desenvolvido pelo National Institute of Advanced Industrial Science and Technology (AIST). Só ainda não percebi a questão das mãos. Da posição da coluna percebe-se porque é uma questão do balanceamento gravitacional. Muito bom.

Vejam o vídeo do robô que deverá desfilar em breve em Tóquio num desfile de moda.

janeiro 09, 2008

Plantec e o vale de Mori

Peter Plantec, autor de Virtual Humans, publicou recentemente o artigo "Crossing the Great Uncanny Valley" na VFXWorld sobre o efeito Uncanny Valley. Ficam aqui alguns dos pontos mais interessantes do artigo.


Dimensões do Uncanny Valley
Look: Cartoonish / Photoreal
Morphology: Monster / Human
Behavior: Stylized / Recognizable
Face: Unfamiliar / Familiar
Voice: Character / Recognizable
Animation Style: Squash-and-Stretch / Tweaked MoCap
Plantec refere que na generalidade dos casos, quanto mais à esquerda em qualquer destes eixos, mais fácil se torna vender o personagem. Quanto mais à direita, mais difícil será vender a ilusão. Não que este modelo traga algo de muito inovador ao conceito de Mori (1970), mas serve pelo menos para se poder trabalhar no concreto o problema.

Interessante foi um reparo feito por Plantec a título de mera curiosidade, mas que achei deveras importante:
As an aside, the artists and engineers at Electronic Arts discovered some of that when they reverse engineered real-humans to make them appear virtual in a game cinematic. I was told that they had to remove such things like skin pours and arm hair, and that they gelled the real hair to make it seem less real. Habib Zargarpour, vfx pioneer and art director at EA, told me: "We had to remove all the stuff that virtual humans don't have right yet in order to get believable virtual humans -- played by real humans.
Ou seja, mais uma vez se vem comprovar a tese das convenções, das formatações de condutas esperadas pelos espectadores e no fundo do "realismo perceptual" de Stephen Prince (1996).

Imagem do ilustrador Soa Lee